Interior da basílica de São Pedro de Roma
Todo o peregrino, quando chega à Roma, deve ir a Basílica de São Pedro e tocar a estátua do fundador da Igreja Católica. Esta estátua encontra-se no interior da maior igreja da cristandade, São Pedro de Roma. A profusão de obras escultóricas, as dimensões e a qualidade do trabalho arquitetónico faz desta basílica o culminar artístico do Renascimento romano. Proponho-vos uma visita de mais de um século de trabalho, onde se sucederam Bramante, Rafael ou Miguel-Ângelo…
O tempo de espera durante o controlo de segurança, dá-nos um momento para observar o que nos rodeia. Com um olhar meticuloso, observamos com atenção a colunata de Bernini, sobre o qual já escrevi e podem saber mais no artigo da Praça de São Pedro.
A igreja é a maior do mundo, isto é, se omitirmos o delírio faraónico de Félix Houphouët-Boigny: a Basílica de Yamoussoukro, cópia em betão de São Pedro de Roma…Não é tanto o seu tamanho que impressiona, dado que já estamos acostumados às construções monumentais, mas sim, pela profusão e a riqueza decorativa, onde os maiores nomes do Renascimento se sucederam para nos oferecer o que de melhor se fazia nesta época. Quanto aos fiéis, eles vêm aqui para admirar o extraordinário baldaquim baroco, debaixo do qual, segundo a tradição católica, encontra-se a sepultura de São Pedro, o primeiro dos apóstolos.
Existem quatro grandes basílicas em Roma, das quais São Pedro tem um papel de relevo. As três outras, são a Catedral de Roma de São João de Latrão, a Basílica de Santa Maria Maggiore e a Basílica de São Paulo Fora Dos Muros, todas elas, propriedades da Santa Sé. São todas excecionais, todas valem por si só, uma viagem à Roma. Um peregrino nunca ficava desiludido da sua viagem! São Pedro, enquanto basílica maior e os seus 2,3 hectares de superfície, esconde muitos tesouros, vamos descobri-los por ordem cronológica e por arquiteto a medida da nova construção da basílica, entre a primeira pedra em 1506 e a sua consagração mais de 120 mais tarde, em 1626.
São Pedro de Roma segundo Bramante
Quando Donato Bramante, ganhou o concurso lançado pelo papa Júlio II para construir a nova basílica, o arquiteto vindo da pequena cidade de Urbino, estava no pico da sua Arte. Reconhecido pelo papa, tinha dado provas em Roma sobre o Tempietto, um pequeno templo comemorativo situado na igreja de San Pietro in Montorio. Começou os trabalhos no Palácio Apostólico, lugar onde se encontram na atualidade, uma grande parte dos museus do vaticano, logo ao lado de São Pedro, momento em que foi encarregado de reconstruir a basílica. Bramante foi louvado pela sua capacidade de recriar a qualidade arquitetónica da Roma Imperial, na mais pura tradição do Renascimento, que desejou voltar ao saber da Antiguidade.
Bramante estava em rutura com a tradição medieval que construía as igrejas em forma de cruz latina. A sua escolha pela cruz grega, (todos os braços da cruz são de tamanho idêntico) era audacioso e harmonioso, mas não necessariamente ao gosto do prelado. No entanto, o papa Júlio II, um soberano esclarecido do seu tempo, aderiu a esta nova ideia, e os trabalhos puderem dar início.
Nos projetos de Bramante, o centro da sua planta em cruz grega devia ser encimado por uma cúpula, como no caso do Panteão de Roma, mas com a diferença em relação a este venerável monumento antigo, a cúpula de São Pedro iria apenas distribuir o seu peso em cima de quatros gigantescos pilares. Estes pilares são visíveis nos dias de hoje, suportam realmente a grande cúpula. São massivos, mas permitem uma grande abertura no espaço dentro da igreja, sem a necessidade de recorrer à paredes mestres. Também devemos à Bramante, a organização da igreja em redor do espaço central, onde se encontram o baldaquim e o altar.
Os trabalhos foram interrompidos após a morte de Júlio II em 1513, e pouco tempo depois, do próprio Bramante em 1514. Após o falecimento do mestre, é Rafael, também ele vindo de Urbino e sob a proteção de Bramante que tomara conta do prosseguimento dos trabalhos.
São Pedro de Roma segundo Rafael
Bramante foi substituído por três arquitetos, Giuliano da Sangallo, Fra Giocondo e Rafael. As suas contribuições são essencialmente visíveis nas plantas: passa-se da cruz grega para a cruz latina e adiciona-se uma grande nave. A vantagem de passar de uma planta em cruz latina para uma cruz grega é simples, aos olhos dos contemporâneos de Rafael: o antigo recinto sagrado da velha basílica de Constantino encontrava-se assim inteiramente na nova, permitindo também honrar as velhas tradições arquiteturais. Rafael era o único mestre responsável pelas obras desde 1516, complementa a planta criando duas absides de cada lado da nave central. Quando Rafael falece em 1520, os trabalhos ainda estavam numa fase muito incipiente.
O seu sucessor, Baldassare Peruzzi, o melhor discípulo de Bramante, decidiu voltar à planta em cruz grega do seu mestre. Facilmente compreende-se a dificuldade dos avanços dos trabalhos, tanto pela mudança dos arquitetos, como pelo Saque de Roma em 1527, pilhada pelas tropas de Carlos V. Esta pilhagem foi uma enorme catástrofe para a Cidade Eterna. Peruzzi volta para a sua cidade. Após a morte de Peruzzi em 1536, a basílica está ainda longe de ficar concluída. Sucede-lhe Sangallo o Jovem, cujo trabalho foi essencialmente focado no fortalecimento dos pilares centrais que irão suportar a futura cúpula.
São Pedro de Roma segundo Miguel Ângelo
O que podemos ver hoje em São Pedro de Roma, é essencialmente da feitoria de Miguel Ângelo. Apesar de ser contra a sua vontade, é escolhido pelo papa Paulo III em 1547. O artista já tinha nesse momento mais de 70 anos. A cúpula atual é fruto do trabalho de Miguel Ângelo, respeitando assim o desejo do plano original de Bramante de obter uma cúpula. Aquando da morte de Miguel Ângelo em 1564, é o seu assistente Jacopo Barozzi da Vignola, que será encarregue de continuar os trabalhos e acompanhado por Giorgio Vasari, encarregado pelo papa Pio V de se certificar que tudo estava conforme o desejo de Miguel Ângelo.
Todo o talento de Miguel Ângelo é visível na organização do espaço interior da basílica debaixo desta cúpula gigantesca, a mais alta do mundo. A obra do artista que nos ficou principalmente na memória é a sua celebríssima Pietà, situada muito próxima da entrada da basílica. Foi esculpida por Miguel Ângelo quando a antiga basílica ainda estava em pé e que a nova ainda estava em projeto. Era o ano de 1499, 48 anos antes de Miguel Ângelo assumir a responsabilidade da condução dos trabalhos de São Pedro de Roma. Tratava-se de uma encomenda de um cardial francês, Jean de Bilhères, destinada a decorar a capela dedicada aos reis de França na antiga basílica de São Pedro.
São Pedro de Roma segundo Giacomo della Porta e Domenico Fontana
Os trabalhos pouco avançaram ao longo dos anos. Era difícil encontrar um sucessor para o grande mestre. Em 1585, é Sisto Quinto, um papa dotada de grande energia que nomeia Giacomo Della Porta na direção dos trabalhos, assistido por Domenico Fontana. Terminarão a construção da cúpula em 1590, às custas de um esforço arquitetónico, humano e financeiro colossal. Giacomo della Porta é um dos iniciadores do Baroco e o desenhador da fachada de Igreja de São Luís dos Franceses.
Lembremo-nos de Domenico Fontana pelos seus trabalhos sobre os obeliscos, é ele que levantara o obelisco do Vaticano em 1586, no centro da praça de São Pedro e mais tarde, os obeliscos de Santa Maria Maggiore e de São João de Latrão.
No pico da cúpula, encontra-se a lanterna, da autoria de Fontana. Foi concluída sob o papado de Gregório XIV. Com Clemente VIII, uma cruz que foi instalada no pináculo. É possível subir até ao cimo da cúpula de São Pedro, ficando-se mesmo por cima dela (o acesso é pago). A vista lá de cima é fenomenal, com um panorama sobre toda a cidade de Roma. Mas atenção, é preciso merecer para lá se chegar em cima, é preciso passar por uma escada e um pequeno corredor que são tão estreitos que só se pode passar com uma pessoa de cada vez!
São Pedro de Roma segundo Carlo Maderno
Em 1602, é a vez de Carlo Maderno tomar a direção dos trabalhos. Sobrinho de Domenico Fontana, partilha com o seu tio, o seu dinamismo. Maderno terminará por fim a basílica de São Pedro adicionando a nave da fachada atual, dando assim a sua planta definitiva em cruz latina à maior igreja da Cristandade.
É na nave que podemos encontrar a estátua de São Pedro, venerada pelos peregrinos desde o século XIII. Os seus pés estão completamente desgastados, os fiéis vinham aí esfregar as suas mãos. Também encontramos aqui, 39 estátuas de santos, fundadores das congregações religiosas. O teto da nave só será decorado com estuques dourados em 1780 no tempo de Pio VI. Em 1615, as obras principais estavam finalmente terminadas sob o pontificado de Paulo V. Maderno, apesar de falecer em 1629, viveu tempo suficiente para assistir a consagração de São Pedro de Roma em 1626.
São Pedro de Roma segundo Bernini
Os trabalhos não terminaram de imediato, os trabalhos decorativos continuaram durante os anos seguintes, a isto vinha-se juntar a estatuária e as pinturas. O interior da basílica é coberto de mármore policromado, de estátuas, de quadros e de tesouros inestimáveis. O toque final terá lugar no tempo do papa Alexandre VII, que encomendou em 1656 a Bernini, a gigantesca colunata da praça de São Pedro. O que chama mais à atenção no interior da basílica, é o impressionante baldaquim central, situado logo por debaixo da cúpula, com a função de proteger o altar e o túmulo de São Pedro. Este baldaquim, da autoria de Bernini, por mais magnífico que seja, é um crime artístico e histórico. Para se obter bronze suficiente para criar este imenso baldaquim alto de 29 metros, decidiu-se mandar abaixo as veneráveis portas de bronze do Panteão! Os primeiros arqueólogos romanos, testemunhos deste crime, insurgiram-se, mas não foram, apesar dos protestos, ouvidos. É a maior peça em bronze do mundo.
Bernini, irá criar dentro dos quatro grandes pilares centrais, uma passagem para poder subir aos nichos cavados para esse efeito. Esses nichos abrigam as relíquias mais sagradas do mundo cristão: a lança de Longinus, o véu de Verónica, um fragmento da Verdadeira Cruz, e uma relíquia de Santo André. Podemos reconhece-las a partir de baixo, graças as monumentais estátuas que as representam. Bernini, também irá tomar conta da Cadeira de São Pedro, (Cathedra Petri). Irá criar um pequeno cofre, de acordo com o baldaquim no cruzamento do transepto. Podemos vê-lo na extremidade da basílica dentro da abside. Em teoria, era a cadeira do apóstolo, mas na verdade, era uma prenda do rei Carlos II o Careca ao Papa em 875, ano em que ele foi imperador do Ocidente.
No nártex, o grande alpendre da basílica, podemos ver obras menos polémicas, como duas estátuas equestres: uma de Constantino por Bernini e outra de Carlos Magno por Cornacchini. No início da nave, podemos encontrar grandes lajes circulares, um disco de porfírio, onde Carlos Magno foi sagrado imperador. Encontraremos inúmeras estátuas de papas com os seus monumentais mausoléus, entre os quais, o do Alexandre VII, realizado por Bernini.
Nenhuma igreja ficaria concluída sem os seus sinos. Apesar da ausência de verdadeiras torres sineiras, São Pedro de Roma tem na sua posse, os mais belos sinos do mundo. O mais venerável recua até ao ano de 1288. Estão situados dentro dos relógios que podemos observar em cada canto superior da fachada.
Temos dificuldade em perceber o tamanho da Basílica. Sinceramente, quando a vemos de longe, ou mesmo quando estamos dentro dela, ela não parece assim tão grande. São as proporções que provocam isso. Só conseguimos ter uma ideia olhando para as outras pessoas, e comparando-as ao resto do edifício. Se olhar para as fotografias de São Pedro de Roma prestando a sua atenção aos turistas, tomarão por certo que parecem simples formigas! Poderíamos ficar o dia inteiro, ou melhor, uma semana inteira para descobrir todas as maravilhas, canto por canto, estátua por estátua, da basílica de São Pedro de Roma.
Muiíssimo ilustrativo e singela historia.
Excelente explanação!
SIMPLESMENTE MARAVILHOSO!!! É IMPONENTE, MISTERIOSA E AO MESMO TEMPO HIPNOTIZANTE!!